Tal Vez

Que tal vez
rompa um tempo para separar as coisas.
Que tal vez
encontre um lugar para misturá-las.
Que tal vez
invada uma fresta para iluminar.
¬ lpz

Fronteira sem Beira

Sonhar é acordar pra dentro.
Sonhei e fui.
¬ lpz

No Rush!

Nós e o caminho,
o rush repleto de nós,
a massa rouca

lava das gentes
levas de sonhos
em maçarocas.
¬ lpz

Legatum Memoriae

O legado da memória é a presença na ausência.
¬ lpz

O Escafandro

Estendo o meu escafandro sobre a cama. Sua superfície é um mapa de relevos espantosos. Apesar das depressões no couro, deixadas pelas ondas de choque que recebeu no mundo ido, não há vazamentos. O engraxo, besunto o piche e o visto. É hora. Salvo das possíveis pressões, mergulho na animosfera das profundidades mundanas.
¬ lpz

Tatuagens Invisíveis

Tantas as formas todas.
Um trânsito de esconderijos,
adir de corpos em vagas,
parcelas do produto.
E ainda há a chuva, o oceano
e as tatuagens invisíveis.
¬ lpz

Poesia Extrema

Trema, opressão
extrema!
O poema de pressão
extrema
teima na alegria
extrema.
¬ lpz

όλο

O tempo é um lugar
pra povoar
no vir a ser.
¬ lpz

O Respeito

Há quem respeite o outro
como a um que tema ou sirva.
Mas esta sopa é rala!
Não a como, medo medonho!
Nutrir assim um sujeito de respeito?
¬ lpz

Verbodrama

Este autor é um ator.
Dínames da palavra.
Corpo em fluxo na dança dos estigmas.
Seu verbo é drama.
Sua ação é pensar.
¬ lpz

A Iniciação Adâmica

Todo um paraíso em chamas.
Sinta o beijo! Queima até a raiz.
Nu. Pelo. Mundo.
¬ lpz

Uma Beleza...

Como é bela a atividade humana sem serventia...
É quando a humanidade extrapola a sua condição de mortal.
¬ lpz

[Vídeo publicado em 12/05/2013, versão de 'Space Oddity' de David Bowie, gravado pelo comandante Chris Hadfield a bordo da Estação Espacial Internacional]

A Oração da Autoria

É bastante duvidosa a afirmação de que haja de fato o fenômeno da originalidade, ou que exista uma assinatura hereditária para métodos, ou ainda, partos genuínos para ideias supostas incomuns. Faz mais justiça à dinâmica mundana o conceito de criatividade como produção de acentos. Um pulso ininterrupto, um sistema de forças que flui se revigorando, se transvalorando, residindo por alguns instantes em endereços provisórios para dar alguma noção do mundo para si. E, pensando assim, a criação autorizada seria uma invenção! Como o juros para o valor das coisas! Talvez fosse menos conflitante dar valor à prática de acentuar. É... Pois, parece evidente que a autoria, como concepção, se trata da crença na propriedade. Por isso sigo desdobrando nesse devaneio improdutivo... Se assim for, a propaganda, como meio de dar publicidade, não seria, desta crença, a oração?
¬ lpz, acentuosamente...

O Ranço da Opressão

Aquele que se sentiu discriminado e, ao atingir o posto privilegiado, apela para a revanche, cai no vício do seu opressor. Em termos de povo, não expande os limites do popular porque não inclui, não agrega. Ainda que na direção oposta, prima em apenas destruir. Trai a lógica inerente a sua origem plasmada na permeabilidade do gesto e na movência da transformação. Sua rigidez destitui o tirano, mas não a tirania. Seu ranço de trauma confunde afirmação com conversão, e perpetua a mazela ideológica que o agrediu. Com o corpo, o gesto e a voz absortos na fantasia da vingança, recorre à força para inverter o sentido da repulsa nas fronteiras e, ao submeter, reproduz a atitude excludente. Oprime às avessas.
¬ lpz

O Cronógrafo















Penso no ser humano como um designer do seu espaço de temporalidade. Um prisioneiro de sua obra. Ser encapsulado que constitui sua memória à maneira de um cronógrafo. Não de um relógio... é diferente. Há o processo. O humano tem sua percepção sobre a temporalidade atrelada a escrever e descrever o espaço do tempo. Sua memória registra por meio das sensações e dos sentimentos. Edita pelo esquecimento.

É distinto do relógio... que somente certifica, alerta para a convenção de uma mesma chance renovada. Notifica sobre os graus do instituto do tempo, demarca o acordo de uma contagem. Pois, seus ponteiros e dígitos destinam-se a chamar os sentidos e a razão ao encontro com a ideia de que podemos retomar a narrativa ou a argumentação. Perpetua o recalque evocando a repetição simbólica dos números. Induz a mente a reproduzir.
¬ lpz

Ânimo Ondulante





















Estou a centenas de quilômetros do ladeirão do Museu do Ipiranga, das inquietantes figuras rupestres das cavernas de Sete Lagoas, da fronteira episteme do rio Paraná, e a poucos mil do imprevisível rio Acre. Estou no Rio de Janeiro. É aqui que eu moro... que eu nasço. Na cidade onde o mar azul não é mais tão azul. Mas eu também já não sou. Contudo ainda posso, pelo puro luxo, exercitar a minha memória à beira do mar... Pensar sobre os mares que existiram, e quais atravessei.

Os movimentos rebrilhantes do mar atravessam meu córtex como raios, lampejam suas colagens do tempo. Aqueles reflexos projetam em meu corpo as cores e as formas do golfo revolto e vermelho das tele guerras, da verde esperança das regatas, do azul celestial do passeio na praia ou do preto mortal da poluição. Porém é o mar nesse ânimo ondulante que veste a vida de ritmo, me faz entender o pulso das relações, enquanto exibe a sua natureza de dar limite às distâncias.
¬ lpz

Um Lugar pra Gente se Armar?
























Os Senhores das Armas estão rindo à toa com a adesão dos geniosos ingênuos, de formação mediana, praticantes da polemocracia, que apoiam pela Internet:

torturadores,
políticos corruptos,
a violência estatal urbana,
a intolerância de gênero,
a violência étnica,
a vigilância à pobreza,
o investimento midiático à marginália pop,
a fraudável urna eletrônica,
o fanatismo religioso,
a hostilidade penal,
e outros apetrechos.

Aprofundem o olhar...
Jornal é panfleto!
Curem suas iras...

Além do horizonte existe um lugar
de conflito e bravio pra gente se armar?
¬ lpz

Partida Política

Existe o ser politizado e o partidarizado,
são completamente distintos.
Um pretende as incertezas do povo
e o outro pretende as certezas do fragmento.
Além, há o despolitizado e o despartidarizado.
Estes não pretendem.
¬ lpz

Postar... Palavras Transbordadas...

Minhas falas transbordam. Avançam dos meus limites pra me cerzir com o mundo. Não são falas isentas de ação ou emoção. São gritos provenientes das batalhas que travo, são constatações de um mundo vivido. Escrever é virtualidade, mas é ocupar este lugar de litígio na assimetria, é confrontar os bichos que movem o amor de ser humano.

No entanto, cuido pra fazer uso de palavras sem esperanças, porque não nutro expectativas. Não caio nessa armadilha. O mundo é construção. A realidade é seu suporte, é o domínio que parcamente tenho sobre a aparência das coisas. A existência, em sua beleza, sua crueza, seu descaso, seu afeto, seu amor, é tudo o que me atravessa, me envolve, me deforma, me acusa. Minha ausência de lucidez acontece apenas quando teimo em me reformar, cismo em me reproduzir. Isso me deixa triste. Agir e dizer, é que não. Isso é alegria, é poesia.

Aliás, na poesia, minha voz eclode soletrada, musicada, conversada, travada em lutas duríssimas, mas com resiliência, porque não sou besta. Pratico essa resistência maleável que produz palavra escrita, falada e 'fazida'. Por isso, posso atestar, sem hipocrisia, que o que transborda de mim é o que sou no mundo, o que sou do mundo, o que sou, sendo.
¬ lpz

Piedade

A avexante nudez da piedade
é ser menosprezo
trajado de caridade.
¬ lpz

É

Ser é
ser...
ser...
ser...
até morrer.
¬ lpz

A História de uma Imagem

"Nosso presente nunca está sozinho; os fantasmas do passado acompanham nossa ignorância."
[Eduardo Neiva Jr.]

Anda!



O mundo
anda crítico,
anda analítico,
anda clínico.

O mundo anda?
¬ lpz

Vapor de Quitina












Exalo uma bruma suave de tristeza,
um sentimento que me adere e envolve.
Sua natureza não é lancinante, apenas dá o tom.

Antes, era um destilado ácido que corroía a pele,
os nervos, e me torturava.
Agora é turfa que banha a paisagem.

Além da névoa, em seu voo famélico,
um bando de carniceiros se afasta.
Não pode avistar a carniça.

Porque, abaixo do alcance, meu corpo tem como escudo este ar inventado,
esta sua imanência em vapor de quitina,
matéria indígena da própria travessia.
¬ lpz

O Presídio do Mundo











Sob a máscara de um povo pacífico e cordato, o Brasil esconde a violência dos séculos de colonização categórica ou dissimulada. O estigma de 'presídio do mundo' é mantido por micropoderes, por estruturas remanescentes das ditaduras e das escravidões. É uma marca cultivada indelével, com todo o esmero, pela paixão à força produtiva, por uma linguagem de mundo expressamente funcional, descrente na sensibilidade e submissa ao medo de ser.
¬ lpz

[Foto: 'Abordagem Policial na casa do Fotógrafo da Maré']

[Fonte: http://oglobo.globo.com/in/8274750-b34-3af/FT500A/2013050220027.jpg]

A Alegoria da Prudência

"Do passado, o presente age prudentemente para não estragar a ação futura."

[Inscrição presente na pintura 'A Alegoria da Prudência', de Ticiano, 1487 - 1576]

"No quadro de Ticiano, o discurso infiltra-se pela inscrição, prendendo a imagem às etiquetas - passado, presente e futuro. Na camada do quadro, à esquerda, está pintado o perfil de um velho com um barrete vermelho: um auto-retrato de Ticiano, no centro, a representação frontal de um homem de meia-idade, com barba; à direita, o perfil de um jovem louro. Estão sincronizados, no eixo central do quadro, a frase "o presente age prudentemente" e o olhar do homem maduro que nos encara: lembrança surda e terna." [Eduardo Neiva Jr.]

O Destino das Classes







Na relação humana com o trabalho, a classe é fruto da especialização da indústria e do capital.

Discernir sobre o destino do capital é a luta das classes.

Na luta de classe há grandes especialistas em capital.

Entretanto, urge a necessidade de sujeitos que discirnam sobre o destino.
¬ lpz

O Especialista em Vivência

"Nestes tempos de grandes especializações não existe um especialista que seja autoridade em vivência."
[Joseph Chaikin]

[Foto: Open Theatre]

O Ator e o Indivíduo






"A ferramenta do ator é ele próprio, mas o uso de si é informado por todas as coisas que constituem a sua mente e seu corpo - suas observações, suas lutas, seus pesadelos, suas prisões, seus modelos; ele próprio, como cidadão de seu tempo e de sua sociedade. A representação do palco e a da vida estão absolutamente juntas, não querendo isso dizer que não haja diferença entre ambas. O ator desenha o seu papel no palco a partir da mesma base que a pessoa desenha a sua vida."

[Joseph Chaikin, participante do Living Theatre e um dos fundadores do Open Theatre]